terça-feira, 4 de setembro de 2012




Caiporismo


Entendidas como parte do folclore, as lendas sobre a caipora constituem uma tradição oral difundida em quase todo o Brasil estabelecendo um elo entre a tradição indígena e a capacidade do povo de renovar e recriar novas personificações desse ser fantástico.

Historicamente, o nome Caipora descende do Tronco Linguístico Tupi-Guarani “kaa-pora” , que significa habitante do mato. Nos relatos do Padre Anchieta em 1560 já se reconhecia em nossas terras “certos demônios (...) que os atacam muitas vezes no mato, dando-lhes açoites e ferindo-os bastante". Os índios, para lhe agradar, deixavam nas clareiras, penas, esteiras e cobertores. Para grande parte dos indígenas caipora era uma divindade sagrada que possuía como função social a salvaguarda das matas, e tudo que existia nela.


Logo em diante, com o contato com outras civilizações não-indígenas, este Elemental foi se popularizando e ganhando novas personificações e interpretações segundo a moral e a ordem de onde se difundia, passando muitas vezes a ser reconhecida como uma criatura maligna que trazia azar. Segundo o folclorista Luís Câmara Cascudo, o termo passou a ser pejorativamente entendido como “o mesmo que ter azar, ter sorte madrasta, ser perseguido pelo destino”.


Uma das personificações bastante conhecida até os dias de hoje surgiu no final da década de 50, em uma  troça de rua,  durante as festividades do carnaval de Pesqueira por um grupo de amigos que renovaram  o modo de brincar o carnaval.(figura 1) 

Porem, a origem dessa caipora moderna, muito provavelmente, descende do mito indígena Xukuru do Ororubá pelo qual a caipora é vista como um espetro de almas penadas transfiguradas sob a forma de duas tochas de fogo que assombram a noite os moradores. Essas aparições ilusórias foram se difundindo serra abaixo e a imagem incorpórea foi fazendo parte do folclore local até que ganhou a identidade de Pesqueirense.


 
figura 1. personificação da caipora pesqueirense

Mais precisamente no ano de 1962, João Justino ressurgiu a  irreverente troça carnavalesca “Os Caiporas” com uma nova cara bem mais moderna  vestida de   calça, paletó, gravata, camisa de manga comprida e uma máscara com a pintura de um rosto traçado de modo bem extravagante feita com um saco de estopa que cobre da cabeça a cintura. "Antigamente o intuito era assustar as crianças. Mas hoje só os cachorros têm medo quando nos veem vestidos assim", segundo João Justino, vulgo Gilete.

Desde então, sobretudo na década de 80, os caiporas passaram principalmente a ser a representação iconográfica de maior espetacularização dentre todas as agremiações do carnaval de Pesqueira constituindo um patrimônio imaterial. E o que era a principio lendário, sobrenatural, assombroso e azarento passou a ser personificada na maior festa popular de Pesqueira como um ícone vivo mesclado de elementos da identidade cultural pesqueirense e que vem atraindo o interesse da mídia para divulgá-la para todo o Brasil.


 
figura 2. indumentaria típica da caipora composta por calça, paletó, gravata e camisa de manga comprida.


foto 3. mascaras com a pintura de um rosto traçado de modo bem grotesco feita com um saco de estopa.

domingo, 26 de agosto de 2012





 A festa de Nossa Senhora das Montanhas


O festival acontece todos os anos, na Vila de Címbres, em Pesqueira, Agreste pernambucano, é comemorada a Festa de Nossa Senhora das Montanhas, padroeira do lugar. As celebrações começam no dia 23 de junho com a Buscada da Lenha. Os indígenas, cristianizados pelos oratorianos em meados de 1661, vão ao mato colher os restos de um angico derrubado de véspera, e voltam em procissão, a fim de acender em frente à igreja uma fogueira como forma de reverencia a divindade da natureza.Para a Igreja Católica a festa  é para Nossa Senhora das Montanhas. Para os indígenas Xukuru do ororubá é para mãe Tamain.

Logo após tem início a Novena, que se estenderá até o dia 1º de julho, quando é feita a festa oficial da santa. Mas, ao final do primeiro dia, já acontece uma outra celebração, em que os índios tocam o toré na Pedra Sagrada, e caminham de pés nus sobre as brasas da fogueira. São convocados os antepassados da tribo, a fim de que comemorem juntos com os vivos. E para que os mortos convidados não se percam de seus familiares na multidão, cada família traz na cabeça flores de cores diversas, que os identificam.

O ponto culminante da festa é a procissão, que reúne pelo menos 5 mil pessoas, também tem parque de diversão,bacamarteiros,cangaceiros, barracas de lanches e bares.

A festa não aparece como ruptura com o cotidiano, mas antes, como o seu engrandecimento, momento em que energias acumuladas “explodem” e toda a alegria, a exuberância, a beleza, a quebra das regras, o exagero são manifestados (LEFEBVRE, 1958).


Essa curiosa celebração tem semelhanças  aos cultos pagãos, de forte relação e diálogo com os elementos da natureza, cultos estes que traziam a garantia de fartura, de fertilidade e de proteção contra catástrofes naturais. 

A festa era, portanto, o momento oportuno para agradecer à natureza pela colheita recente e farta, a alegria e a energia do encontro e da atividade coletiva durante o período solsticial, que é o limite máximo alcançado pelo sol no horizonte dando a impressão de estabilização. Nesse dia, será a noite mais longa do ano, pois é quando recebe a menor quantidade de raios solares.

Com o crescimento do poder da Igreja Católica sobre a sociedade, a festa  (da e para a natureza) começou a representar uma ameaça à moral, à ordem, segundo os preceitos cristãos. A prática da festa deveria ser, portanto, absorvida pelos seus dogmas, sendo o calendário religioso um dos instrumentos desta cooptação.

A Igreja alterou os dias santificados para que coincidissem com os meses de trabalho mais leves, do inverno à primavera, do Natal à Páscoa, unindo o calendário católico ao agrário.Assim, a Igreja poderia ter o controle sobre a vida do homem na sociedade. 

consequentemente,como explica Thompson(1998: 51): A Igreja, ao permitir a permanência de alguns elementos ( os considerados“inof ensivos”) das manifestações festivas pagãs, foi caracterizando-os como “folclóricas” e que desempenham funções sociais no grupo indígena Xukuru do Ororubpa, através da transmissão de crenças e costumes, as quais se sintetizam como práticas estabelecedoras de elos entre o antepassado remoto e o presente que resistem quando ligados à superestrutura econômica e social.

A festa indígena de Cimbres expressa às apropriações e reinterpretações pelos Xukuru dos espaços e símbolos religiosos coloniais. e, constituíram em uma forma de afirmação cultural-étnica, de fortalecimento nas reivindicações dos direitos indígenas. Como expressam os Xukuru: mãe Tamain é aquela que leva a gente pra luta.com a força de Mãe Tamain, ninguém para a gente não. Mesmo quando nos era mais perseguido, nossa mãe sempre protegeu nosso ritual aqui na vila”. Visto que “Tamain nasceu em Cimbres, ela era um cabocla”. (NEVES, 1999, P.182)




foto 1. Imagem de nossa Senhora das montanhas.

foto 2. oferenda de agradescimento tamain.

                                          foto 3. hibridismo cultural entre a cultura indígena Xukuru do ororubá e a religiosidade catolica.
foto 4. missa.


foto 5. apresentações,cortejos e momentos de coletividade.


 foto 6.procissão.


foto7.mastro.


foto 8. interior da igreja de cimbres


foto 9. decoração para temporada de festas.


foto 10. fies em momentos de fé e resistência cultural.



créditos fotográficos:

www.xisclub.com.br




quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Singularidades das paisagens serranas


   

  A imponente serra do Ororubá serve de cenário para a comunidade indígena Xukuru do ororubá na região agreste central de Pernambuco onde causa uma grande fascinação pela sua fauna e flora,suas cachoeiras, sua cumeeira lendária, pela sua importância como lugar geológico e geomorfológico, mas, acima de tudo, pelo testemunho  que salvaguarda a memoria do período colonial. 



  As grandes atividades atividades humanas nesse lugar começaram no período pré-colonial por grupos indígenas, em seguida  pelos  colonizados portugueses e , posteriormente, pela modernização de novas técnicas de trabalho advindas da industrialização. Os recursos naturais  forneceram a base da prosperidade econômica até meados do século XX onde todo esse ciclo de produção se vê expresso na bela arquitetura colonial da fazenda histórica de Santa clara.


Todo o  entorno paisagístico indica  a  historia da interação do homem em atribuir e imprimir identidades , logo, tudo o que é natural é também cultural. Ao pé da serra do ororubá a cultura indígena local organiza, compreende e dela faz o uso. Apenas os homens podem conferir valores a um recurso natural, a uma paisagem salvaguardando suas identidades interiorizadas 

  Segundo ALMEIDA & RIGOLIN (2005), é nas paisagens que estão inseridos todos os elementos presentes no espaço geográfico: os elementos naturais (vegetação, relevo,geomorfologia, clima, etc.) e os elementos humanos ou culturais (que são os produzidos pela sociedade: casas, currais, estradas, jardins).
 
  Quando observamos as fotografias anexas das paisagens situadas no pé da serra  podemos apontar os elementos que formam a paisagem desse lugar: matas, serras, casas, cercas, etc. No entanto, ate os pequenos lotes territoriais descrevem as relações sócio-econômicas locais e a plasticidade da cultura em estabelecer o seu domínio com a natureza , responsáveis, assim, pelo "retrato" de um lugar, ou melhor, um insight cultural.




terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Rocailles: luxo e extravagância


Do francês rocaille (concha, cascalho), mas apesar de já existirem na Grécia, o destaque luxuoso e não religioso desses elementos estéticos provem do estilo rococó (também chamado estilo Luis XV) que se desenvolveu principalmente no sul da Alemanha, Áustria e França, entre 1730 e 1780, caracterizados pelo excesso de curvas caprichosas e pela profusão de elementos decorativos como conchas, laços, flores e folhagens, que buscavam uma elegância requintada.

A estética rococó foi introduzida no Brasil a partir do século XVII pelo qual esta escola floresceu notavelmente no Nordeste, e muitos dos seus elementos eruditos decorativos mais característicos estão presentes na ornamentação carregada de diversas construções na cidade de Pesqueira.

Apesar de grande parte das fachadas das casas apresentarem esses rocailles elas não são do estilo rococó, mas pertencem ao estilo eclético que muito utilizou desses elementos com o intuito de expressar por meio dessas alegorias decorativas uma sensação de jocosidade na teatralidade, uma leveza na estrutura das construções, uma refinada artificialidade dos detalhes, bem como a extravagância do luxo das classes burguesas mas sem a dramaticidade pesada nem a religiosidade do barroco.

Assim, esse esplendor expressa ao observador uma alegria de viver por meio da decoração galante e nos convida a cortejá-lo por meio do exagero supérfluo.





A poética bucólica dos chalés


 "A casa é fisionomia da cultura” (Gilberto Freyre).

  Os chalés são construções que exemplificam bem as fronteiras  entre o popular e o erudito, pois representa na cidade de Pesqueira uma reinterpretação de um estilo europeu trazido pela elite econômica ou pelos imigrantes, e que posteriormente acabou assimilado e popularizado praticamente em vários pontos da cidade com o intuito de adotar características de residências rurais, construídas parcialmente em madeira, de algumas regiões européias, numa leitura claramente romântica. 

O seu telhado em duas águas dispostas no sentido contrário ao da tradição colonial, com as empenas voltadas para a rua, já indicava a necessidade do afastamento do prédio em relação aos limites do lote, transformando a repetitiva paisagem luso-brasileira.

  De madeira ou de alvenaria, algumas vezes com lambrequim (do Holandês: lamperkijm), Beiral, Friso e outros elementos que em sua poética  instigavam o observador a bucolizar  um estilo de viver "fugere urbem"  evocando a uma tranqüilidade dos campos às modernas técnicas construtivas. Evidentemente, essas construções só puderam ser desenvolvidas apenas em regiões abundantes em madeiras o que ocasionou em Pesqueira apenas a utilização destas apenas nos telhados em duas águas e a adaptação a outros materiais mais viáveis.